sábado, 19 de setembro de 2009

Exemplo de como o tempo se comporta de formas diferentes para cada um

Ontem encontrei uma velha amiga
Que agora tinha sua personalidade
Modificada por uma tesoura, mas que
Ainda ambientava seus sonhos
No infinito. Conversamos bastante,
Ela me chamando por um velho
Nome que se perdeu na linha do tempo
Ou em alguma linha de minha
Carteira de identidade por
Entre a bagunça da minha
Carteira. Ria de lembranças
Enquanto fingia escutá-la,
Às vezes brincando de lembrar
Qual era a cor de seu cabelo
Na época, às vezes tentando
Descobrir o que havia de tão novo
Na sua dicção e no seu vocabulário.
Percebi que o mito do tempo não
Passa para todos, percebi que eu
Havia envelhecido mais, sendo
Ainda tão novo, até mais novo que
Ela, mas como não consigo
Enxergar infinito nem rejuvenescer,
Como não consigo mudar minha
Dicção nem o meu vocabulário,
Decidi me despedir dessa outra
Em que se transformou minha
Amiga, para se manter mais
Jovem, e finalmente pensei que
Talvez fosse eu o único velho
Amigo ali presente.

Vieira Hartmann
Se não tem títulos
Meus poemas de amor
É porque é só um
Todos os meu poemas de amor.
São as mesma palavras
Repetidas de um mesmo e só
Amor.
Amor que renasce, infla,
Gela, derrete, esquenta...
Seriam incompatíveis
Títulos se não há amores.
E seriam incompatíveis
Amores, já que não passo
De um único título.

Vieira Hartmann

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Se finjo que te amo,
É por que finjo ser teu?
Te amo mais por fingires que finge
Que desconfias do que não sabes,
Te amo por ser meu
O teu amor que não me deu,
Te amo por ser rasa
Qualquer explicação profunda
Do teu amor. Te amo com palavra
Corpo e solidão, e encharco minhas
Pálpebras com o curso do rio de teu
Ventre.

Ainda serás minha hoje a noite,
E no alvorecer do eternamente.

Vieira Hartmann

O Abismo

Mijo no bidê! Escarro na pia da cozinha!
Desconstruo o que é real sobre o
Realismo inoportuno das horas e
Grito meu anseio largo em silêncio.

Sofro de um mal de raiz vermelha.
Mal de acinzentados olhos que só
Olham para dentro. E o futuro me da
Vertigem como se escalasse um abismo

Com frutos nas pedras, ninhos vigiados
Por aves de rapina, lagartos que
Piscam as membranas pra focar galhos

Ao invés de me focar, mais um cervo,
Diminuído pelo só privilégio de ser
Tão vivo quanto tudo no abismo.

Vieira Hartmann

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Para o amigo Alexandre Carvalho

(inspirado na Ode à Alegria de Schiller, poema musicado por Beethoven na Nona Sinfonia)

“Ó, amigos, mudemos de tom!
Entoemos algo mais prazeroso
E mais alegre!...”

... o som desloca-se ao longo
E ele para longe
Como um close para o fim
Chega ao começo sua vida,
Ó, Irmão da filha do Elíseo!,
Bardo solto que navega.
Muitos dizem que em nenhum lugar mora
Mas ele é vivo onde passa
E sempre sabe bem quando está em casa.

O som aumenta
Seus pensamentos no mar cessam
Enquanto percebe na tônica um novo naipe
Um arranjo invejável...
- Uma coca antes do embarque?
Esquecesse de sua irmã,
E mesmo com uma luz vespertina
Tentando rigorosamente luzir pelo sorriso
Ele não deixa de perceber que já é noite...

“...Quem já conseguiu o maior tesouro
De ser o amigo de um amigo,
Quem já conquistou uma mulher amável...”

Ouve as últimas notas da nona
Ri pra si mesmo com esforço
Para seguir alegremente
-“Como o herói diante da vitória”-
Enquanto atravessa as portas da ala de embarque.

Responde sem pensar ao segurança
e nem sabe se pensou ou no que respondeu
5 minutos depois.
O tempo malicioso finge passar lento
Mas mais astuto ele percebe que a sinfonia acabou...
- Acabou?

Mais uma fez ri sozinho
Dessa vez endereça a natureza tal feito,
Agradece os beijos e vinho
E os amigos leais até a morte.

É privilegiado pelo céu estrelado,
Que no vidro somado ao seu reflexo
Desenha-o sob as estrelas...
E então, finalmente percebe que está em casa,
Pois lá, solto sob as estrelas
É onde ele mora.

Vieira Hartmann